A FÁBRICA

Maio 08 2006

A mudança e a evolução esperadas de alguns comportamentos da Humanidade não estão a atingir os níveis desejados, mesmo em questões pequenas no contexto global. É devido a estas últimas, que se vão observando diariamente, que o pessimismo se nos vai enraizando na alma. Alguém disse um dia que um optimista é um pessimista mal informado. Nesta perspectiva, podemos avaliar estas questões enquadradas na importância que deveria ter a articulação, no actual modelo de Educação, entre as matérias disciplinares e o estabelecimento de referências. Não existem referências efectivas que motivem as pessoas a agirem de maneira diferente, que não podem limitar-se a serem conceitos abstractos, sem sentimentos reais envolvidos. Tem que passar a mensagem de que são algo de fundamental à consolidação da democracia. A verdade é que as escolas tornaram-se especialistas em formar “debitómetros” de conceitos teóricos, muito importantes para o desenvolvimento profissional, mas esquecem-se de complementar isto com formação cívica, importante para o desenvolvimento do ser Humano.
Considerando a nossa transição de ditadura para um novo regime democrático, que foi feita de uma forma tão surpreendentemente pacífica e rápida, o que contribuiu para imbuir todos os portugueses de uma estranha sensação de desorientação. A facilidade com que se obteve levou a que as pessoas não se esforçassem o suficiente para a manter saudável e progressivamente mais sólida. Nos anos que se seguiram até aos dias de hoje, em muitos aspectos, viveu-se num país de fantasia, onde o pensamento dominante foi de que tudo estava garantido para sempre e, de uma forma ou de outra, com raízes profundas nos anos da ditadura em que não existiam direitos nenhuns, cada sector da sociedade foi impondo a sua força para obter dos governos as suas pretensões, nem sempre de forma razoável, até ao ponto em que se encontram agora.
É fácil de perceber que a actual situação não se pode protelar por muito mais tempo sob pena de não haver retorno possível. Teremos sim um País onde o instinto de auto-preservação será o sentimento dominante, algo semelhante a outros onde se presenciavam filas para conseguir papel higiénico. Ao que parece, a mensagem de que algumas coisas são incomportáveis para o País coincidiu com o surgimento de uma grave crise de problemas auditivos, ou então de óbvia diminuição de capacidades intelectuais, numa espécie de acefalia generalizada. Ninguém quer perder os seus direitos e recomendam que os problemas se resolvam sempre à custa dos outros.
Analisando com rigor e desinteressadamente a situação actual, cada um por si chegará à conclusão que é necessária a participação de todos, que é necessário um esforço conjunto para que se garanta a sustentabilidade das gerações vindouras. E é nestes que temos que pensar. Então estamos ou não a preparar o futuro das próximas gerações? Parece-me evidente que se não organizarmos o presente, o futuro não será o que todos ambicionámos. Não há, neste momento, qualquer lugar para ambivalências. Não será esta uma forma de egoísmo? Ou a tão propalada solidariedade entre gerações só tem um sentido, aquele que nos interessa.
Uma das manchetes desta semana do JN revelava que 85% dos pensionistas tem uma reforma inferior a 374€. Estas reformas baixas resultam necessariamente de rendimentos baixos durante as suas carreiras profissionais e, portanto, o problema da segurança social não se coloca em relação a estes mas aos restantes. Qual será a parte destes 15% que, aproveitando as lacunas da legislação (nada de extraordinário em Portugal), não efectuou a totalidade dos descontos sobre os seus rendimentos à excepção dos últimos 10 anos? A solidariedade geracional foi esquecida enquanto foi conveniente, pelos mesmos que agora não se esquecem de a cobrar na forma de pensões elevadíssimas, que nada têm a ver com a realidade da sua carreira contributiva. Aliás, seria um exercício revelador aplicar as regras que agora vão regular esta matéria a estas reformas de luxo e verificar o resultado final. Ao abrigo da treta dos direitos adquiridos e de uma legalidade imoral, muitas pessoas, premeditadamente, planearam os timings das suas contribuições de modo a que tirassem o máximo benefício de todos os seus rendimentos. São estes que estão a arruinar o sistema, reclamando uma solidariedade quando não foram absolutamente nada solidários.
O autismo que isto revela, contribui para criar uma sensação de injustiça que, inevitavelmente, afasta os restantes do cumprimento dos seus deveres de cidadãos. Este afastamento também tem consequência para todos. Não é evidente que quem não cumpre as suas obrigações sociais não só prejudica os outros como também a si próprio? Momentaneamente e a título pessoal, poderá ter uma vida melhor, mas os serviços que a todos dizem respeito, tornar-se-ão, inevitavelmente, piores. Ao não contribuir para a melhoria global do País da qual, obviamente, beneficiaria, empurra-o para um estado de insolvência donde, se as coisas não mudarem, provavelmente não conseguirá sair.
É preciso salientar os perigos inerentes ao protelar destes problemas. Nesta fase da nossa democracia e com a tendência que a Humanidade tem para se repetir em ciclos, podemos estar a por em causa os valores democráticos e a preparar a sua substituição. A permanente referência ao Estado na terceira pessoa do plural é algo claramente elucidativo. O Estado não são “eles”, somos “nós”. É esta visão comunitária da sociedade que falta para fazer evoluir o país.
A esperança pode não estar morta, mas está para já moribunda. A indignação, contudo, cresce a olhos vistos.

Filipe Pinto.
publicado por armando ésse às 07:29

Maio 08 2006

A mudança e a evolução esperadas de alguns comportamentos da Humanidade não estão a atingir os níveis desejados, mesmo em questões pequenas no contexto global. É devido a estas últimas, que se vão observando diariamente, que o pessimismo se nos vai enraizando na alma. Alguém disse um dia que um optimista é um pessimista mal informado. Nesta perspectiva, podemos avaliar estas questões enquadradas na importância que deveria ter a articulação, no actual modelo de Educação, entre as matérias disciplinares e o estabelecimento de referências. Não existem referências efectivas que motivem as pessoas a agirem de maneira diferente, que não podem limitar-se a serem conceitos abstractos, sem sentimentos reais envolvidos. Tem que passar a mensagem de que são algo de fundamental à consolidação da democracia. A verdade é que as escolas tornaram-se especialistas em formar “debitómetros” de conceitos teóricos, muito importantes para o desenvolvimento profissional, mas esquecem-se de complementar isto com formação cívica, importante para o desenvolvimento do ser Humano.
Considerando a nossa transição de ditadura para um novo regime democrático, que foi feita de uma forma tão surpreendentemente pacífica e rápida, o que contribuiu para imbuir todos os portugueses de uma estranha sensação de desorientação. A facilidade com que se obteve levou a que as pessoas não se esforçassem o suficiente para a manter saudável e progressivamente mais sólida. Nos anos que se seguiram até aos dias de hoje, em muitos aspectos, viveu-se num país de fantasia, onde o pensamento dominante foi de que tudo estava garantido para sempre e, de uma forma ou de outra, com raízes profundas nos anos da ditadura em que não existiam direitos nenhuns, cada sector da sociedade foi impondo a sua força para obter dos governos as suas pretensões, nem sempre de forma razoável, até ao ponto em que se encontram agora.
É fácil de perceber que a actual situação não se pode protelar por muito mais tempo sob pena de não haver retorno possível. Teremos sim um País onde o instinto de auto-preservação será o sentimento dominante, algo semelhante a outros onde se presenciavam filas para conseguir papel higiénico. Ao que parece, a mensagem de que algumas coisas são incomportáveis para o País coincidiu com o surgimento de uma grave crise de problemas auditivos, ou então de óbvia diminuição de capacidades intelectuais, numa espécie de acefalia generalizada. Ninguém quer perder os seus direitos e recomendam que os problemas se resolvam sempre à custa dos outros.
Analisando com rigor e desinteressadamente a situação actual, cada um por si chegará à conclusão que é necessária a participação de todos, que é necessário um esforço conjunto para que se garanta a sustentabilidade das gerações vindouras. E é nestes que temos que pensar. Então estamos ou não a preparar o futuro das próximas gerações? Parece-me evidente que se não organizarmos o presente, o futuro não será o que todos ambicionámos. Não há, neste momento, qualquer lugar para ambivalências. Não será esta uma forma de egoísmo? Ou a tão propalada solidariedade entre gerações só tem um sentido, aquele que nos interessa.
Uma das manchetes desta semana do JN revelava que 85% dos pensionistas tem uma reforma inferior a 374€. Estas reformas baixas resultam necessariamente de rendimentos baixos durante as suas carreiras profissionais e, portanto, o problema da segurança social não se coloca em relação a estes mas aos restantes. Qual será a parte destes 15% que, aproveitando as lacunas da legislação (nada de extraordinário em Portugal), não efectuou a totalidade dos descontos sobre os seus rendimentos à excepção dos últimos 10 anos? A solidariedade geracional foi esquecida enquanto foi conveniente, pelos mesmos que agora não se esquecem de a cobrar na forma de pensões elevadíssimas, que nada têm a ver com a realidade da sua carreira contributiva. Aliás, seria um exercício revelador aplicar as regras que agora vão regular esta matéria a estas reformas de luxo e verificar o resultado final. Ao abrigo da treta dos direitos adquiridos e de uma legalidade imoral, muitas pessoas, premeditadamente, planearam os timings das suas contribuições de modo a que tirassem o máximo benefício de todos os seus rendimentos. São estes que estão a arruinar o sistema, reclamando uma solidariedade quando não foram absolutamente nada solidários.
O autismo que isto revela, contribui para criar uma sensação de injustiça que, inevitavelmente, afasta os restantes do cumprimento dos seus deveres de cidadãos. Este afastamento também tem consequência para todos. Não é evidente que quem não cumpre as suas obrigações sociais não só prejudica os outros como também a si próprio? Momentaneamente e a título pessoal, poderá ter uma vida melhor, mas os serviços que a todos dizem respeito, tornar-se-ão, inevitavelmente, piores. Ao não contribuir para a melhoria global do País da qual, obviamente, beneficiaria, empurra-o para um estado de insolvência donde, se as coisas não mudarem, provavelmente não conseguirá sair.
É preciso salientar os perigos inerentes ao protelar destes problemas. Nesta fase da nossa democracia e com a tendência que a Humanidade tem para se repetir em ciclos, podemos estar a por em causa os valores democráticos e a preparar a sua substituição. A permanente referência ao Estado na terceira pessoa do plural é algo claramente elucidativo. O Estado não são “eles”, somos “nós”. É esta visão comunitária da sociedade que falta para fazer evoluir o país.
A esperança pode não estar morta, mas está para já moribunda. A indignação, contudo, cresce a olhos vistos.

Filipe Pinto.
publicado por armando ésse às 07:29

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